domingo, 6 de janeiro de 2008

Publicidade: Para quem te pouco ou nada a ver com ela - Parte II: Do reclame ao requinte

Até os anos 50, no Brasil, toda peça publicitária era chamada reclame. Muitas vezes o reclame era em versos (até o príncipe dos poetas, Olavo Bilac, escrevia reclames) e em Cataguases tínhamos este: Não quero que me acredite/ se quiser, prove primeiro/ mas o café do Bar Elite/ é gostoso até no cheiro.
Reclame de remédios era o que mais havia e alguns partiam para a ameaça: Gengivas sangrentas são o primeiro sinal de piorréia.
Vale lembrar aqui um reclame publicado na revista Verde, de Cataguases, nos anos 20 do século idem: José, interessante filhinho de (fulano e sicrana), com uma dose do Vermicida Cesar, que é o melhor dos lombrigueiros, expelliu mais de 500 lombrigas, ficando alegrinho, forte e sadio como se vê.
Muitos reclames, como ainda hoje, eram cantados e o compositor Fernando Lobo, que teve música gravada até por Nat King Cole, disse que seu maior sucesso foi: Melhoral, Melhoral é melhor e não faz mal.
A partir dos anos 40 houve uma modernizada, como substituir o desenho pela foto do produto, que dá mais impacto e credibilidade. Nos 60, já havia comerciais de TV bem elaborados, como uma campanha da Shell com o grupo de rock Os Mutantes aprontando situações meio dadaístas. Mas ainda cometiam trocadilhos como “Volks populi, Volks dei” - para o fusca. E trocadilho é inaceitável, em propaganda.
Por aquela época, Alex Periscinoto introduziu uma série de reformas, a partir da agência à qual se associou, Alcântara Machado. E surgiram outros grandes reformadores, como Neil Ferreira, além de outra grande agência, a DPZ. Grandes, aí, no sentido de inovadores, pois já havia agências enormes, americanas, quase todas, e Neil disse que a propaganda brasileira era o 51º Estado dos EUA. Ironizando, porque o pessoal copiava adoidado. Mas isso mudou, a partir da geração dele.
No meu início de carreira, trabalhei algum tempo na mesma agência que Neil e ficávamos babando com as sacadas dele. Um dinheiro da época tinha notas com as caras de Pedro I e Pedro II. E Neil sacou que o pai, retratado ainda jovem, contrastava com o filho, este com aquela longa barba branca. E estampou um diante do outro, com Pedro I aconselhando: o Meu filho, abra uma caderneta de poupança. Neil acabou indo para a DPZ e desta basta lembrar um anúncio que mostrava uma suculenta salada, e o título: Taka aji-no-moto aki. Humor é fundamental em toda comunicação, até para falar sério. Exemplo: A Associação das Piranhas do Pantanal saúda a matança de jacarés.
Num anúncio para o Dia da Criança, a DPZ deu um show de delicadeza, para a Johnson & Johnson: Com criança não se brinca. Na mesma ocasião, escrevi para o Banorte: Solte a criança que existe em você, querendo dizer que devemos abrir as comportas de nossas repressões adultas. O que bastou para Jaguar escrever, no Pasquim, que rolava na grande imprensa um anúncio idiota, incitando ao aborto. Eu ri, claro, pois não é todo dia que se tem um trabalho criticado por Jaguar.
Alex/Neil/DPZ e outros conquistaram para o publicitário brasileiro o status que tem hoje, profissional respeitado e influente. E a propaganda brasileira tornou-se uma das melhores do mundo, houve ano em que ficou em 2º lugar no festival publicitário de Cannes, só atrás da Inglaterra. Curiosamente, os ingleses ultrapassam os americanos, em propaganda de boa qualidade.
Outra sobre a eficiência do humor: numa eleição para troca da diretoria do Clube de Criação do Rio, uma chapa tinha um nome bobo, tipo Renovação. Já a outra escancarava: Vem cá, meu bem. Ganhou disparado.

Antônio Jaime Soares

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